8 porquês dos atrasos nos projetos
Autor: Armando Terribili Filho da IMPARIAMO®.
59,4% das 400 organizações públicas e privadas que participaram do Benchmarking 2014 em Gerenciamento de Projetos declararam ter problemas no cumprimento de prazos em seus projetos. Grosso modo, pode-se dizer que de cada dez organizações respondentes da pesquisa, seis têm este problema.
Muita gente ainda acredita que o gerenciamento do tempo em um projeto se faz exclusivamente através de um cronograma fixado na parede e um “chicote na mão” do gerente do projeto! A primeira parte, o cronograma fixado na parede, é verdadeira, pois um cronograma é um instrumento de comunicação do projeto, por isso, deve ser constantemente atualizado e divulgado a todos os interessados e participantes, a fim de evidenciar compromissos dos responsáveis pelas atividades planejadas. A segunda parte, o “chicote na mão” do gerente de projetos é um equívoco administrativo de ultrapassados autocratas. É evidente que se deve ter acompanhamento e controle no progresso de um projeto, na execução de atividades, através de organização, disciplina e rigor, porém, isto passa ao largo de posicionamento ditatorial ou punitivo.
Realizando-se uma análise de causa-raiz pode-se verificar que a causa de atrasos em projetos decorre de diversas variáveis, muitas das quais transcendem aspectos comportamentais do gerente de projetos, e se cristalizam em aspectos de gestão, de habilidades gerenciais e competências não técnicas.
Através de uma reflexão pessoal, empírica, pude identificar oito grupos de causas de atrasos em projetos. A apresentação destes itens não obedece a qualquer prioridade, seja de frequência de ocorrências ou qualquer outro critério quantitativo.
1) Escopo mal definido
Se o escopo de um projeto (entregas planejadas) não estiver bem definido, documentado e acordado entre as partes, alterações ocorrerão com frequência no projeto, ocasionando perda de tempo em atividades de replanejamento e de “remendos” ao que já foi definido/realizado no projeto. Outro item que por vezes é decorrência deste é “mudanças constantes de escopo”, ou seja, em função de novas necessidades de negócios ou especificidades do projeto, se torna necessária a realização de alterações no escopo durante seu progresso. Assim, questões relacionadas a escopo, seja ele mal definido ou alterado constantemente, trazem impacto não só em prazos, mas em custos, na qualidade das entregas e na motivação da equipe do projeto.
2) Prazos mal estimados
Os prazos para o desenvolvimento de atividades devem ser criteriosamente estimados, com base em opinião de profissionais especialistas e em lições aprendidas (lessons learned) de outros projetos. Nem sempre isto ocorre, e os erros de estimativas podem ser acidentais ou intencionais. Acidental é o erro de estimativa causado pela incompetência de quem a realiza, por desconhecimento, por falta de pesquisa ou de experiência. Já o erro intencional é quando se subestima a complexidade de um projeto e de suas atividades, a fim de viabilizar o projeto, tornando-o “pseudo” factível em termos de prazos/custos. Neste caso, em curto prazo se verificará o dano causado pelas estimativas excessivamente otimistas. Estes danos não afetam somente cronograma, mas também custos, o “moral” da equipe do projeto e a satisfação do patrocinador do projeto (sponsor).
3) Recursos humanos insuficientes
A falta de recursos no momento planejado para início de qualquer atividade pode trazer impacto negativo ao cronograma do projeto; isto decorre de várias causas: concorrência pelo recurso com outros projetos, falta de recursos com habilidades/conhecimentos para executar a atividade, ou seja, o perfil do executor está aquém do universo de conhecimentos requerido para o profissional.
4) Atrasos na execução das atividades
Qualquer atraso em atividade do Caminho Crítico de um projeto (conjunto de atividades sem folga) causará atraso no projeto. Muitas vezes acredita-se que o atraso na execução de uma atividade em relação ao prazo planejado decorre de incompetência de quem a realiza. Às vezes, isto é verdade, mas nem sempre. Além desta situação, não se pode esquecer que há outras causas, como: (1) falta de instrução adequada ao executor da atividade, seja de forma verbal e/ou escrita; (2) substituição do profissional planejado por outro com habilidades ou experiência insuficiente para realização do trabalho, visando reduzir os custos do projeto; (3) perda de recursos humanos (remuneração inadequada, políticas da organização e plano de retenção frágil); e, (4) estimativas excessivamente otimistas, para não dizer, irreais.
5) Atrasos nas entregas de fornecedores
Outro tipo de atraso, com ênfase em projetos de integração, são as entregas de fornecedores de componentes para o projeto. Há casos que se podem substituir os fornecedores (quando se trata de fornecimento de commodities) com baixo risco, porém, há outros que não, pois são fornecedores pré-qualificados para fornecimento específico para o projeto, sendo que a substituição pode trazer impactos de custos e prazos. Os atrasos de fornecedores têm causas variadas, desde problemas de especificação até negociação mal conduzida. Há casos de baixa qualidade nas entregas, que provocam devoluções ao fornecedor, consequentemente, impactando o cronograma do projeto.
6) Qualidade verificada está aquém da planejada
O problema de baixa qualidade nas entregas do projeto causa retrabalho, pois exige que a equipe refaça o trabalho (todo ou parte dele), causando impacto no projeto. Por vezes, a qualidade pode ficar aquém da planejada; todavia, encontram-se situações em que um escopo mal planejado, com critérios de aceite não definidos de forma explícita, podem fazer com que as entregas sejam alvo de discussões entre as partes (e por vezes, litígios). Ressalta-se que quando se menciona “critérios de aceite”, entende-se como algo factível e tangível, evitando jargões que só dão margem à discussão, como “produto será entregue no estado da arte”, “o sistema será rápido”, “o sistema será fácil de usar e muito amigável”. A opção deve ser por critérios que possibilitem medição, facilitando a constatação, evitando a contestação.
7) Excesso de burocracia na organização
Se por um lado, a falta de processos em uma organização pode ser algo nocivo pela informalidade que isto propicia, por outro, o engessamento dos processos pode trazer impacto nos prazos. O excesso de processos, autorizações e aprovações podem dificultar a alocação ou substituição de profissionais em projetos, retardar o treinamento de profissionais, atrasar as aquisições e assinaturas de contratos com clientes e fornecedores, além de disseminar uma cultura organizacional de “processo decisório complexo e moroso”, caracterizado por níveis de autoridade parametrizados por tipo e/ou valor do projeto.
8) Riscos que se tornam realidade
A cultura de gerenciamento de riscos em projetos ainda está em fase de amadurecimento no país. Há casos em que os riscos são identificados, qualificados e quantificados em tempo de “planejamento”. Isto decorre de exigências internas de muitas organizações que têm a criação desta lista como pré-requisito para realizar a venda de um projeto. Todavia, quando o projeto se inicia, abre-se uma gaveta e esta lista de riscos é lá esquecida, como se os riscos deixassem de existir. Em verdade, além daqueles identificados, novos riscos surgem na execução de um projeto. Quando um risco se torna realidade, os impactos no projeto são notórios em várias dimensões: custos, prazos, qualidade, etc. Os riscos precisam ser gerenciados, as contingências devem ser não somente de custos (como já é disseminado no mercado), mas também de prazos. Há teorias bem atuais que tratam do tema, como o Método de Mosler para qualificação dos riscos, que se utiliza de seis critérios: função, substituição, profundidade, extensão, agressão e vulnerabilidade, contra a tradicional abordagem que considera somente dois critérios: impacto e probabilidade. A utilização de indicadores é recomendável, por exemplo, indicador de gestão de riscos (para garantir que existe uma efetiva e contínua gestão de riscos) e indicador de exposição a riscos (para medir constantemente o nível de exposição do projeto a riscos).
Conclui-se que cada vez mais novas técnicas e abordagens para monitoração e controle de prazos se tornam necessárias, exigindo do gerente de projetos, atualização constante. Um exemplo, seria a utilização do EVM (Earned Value Management) e do indicador SPI (Schedule Performance Index) para verificar a velocidade de progresso do trabalho realizado frente ao que foi originalmente planejado. Há também o Prazo Agregado. Outro exemplo seria a abordagem da Corrente Crítica tendo por base o trabalho de Eliyahu M. Goldratt com aplicação da Teoria das Restrições na área de gerenciamento de projetos.
De qualquer modo, o conhecimento técnico de um gerente de projetos a cada dia cede espaço para o conhecimento específico em gerenciamento de projetos e para os soft skills (habilidades comportamentais), que se fazem cada vez mais necessários no perfil do gerente de projetos: ele precisa saber se comunicar de forma escrita e verbal, deve liderar, negociar, incentivar/estimular a equipe, orientar a realização dos trabalhos, gerenciar conflitos e assumir responsabilidades; além disto, precisa ter iniciativa, organização, compromisso e atitude.
Referência:
PMSURVEY.ORG. Relatório Mundial 2014 de Gerenciamento de Projetos. Disponível em: <http://www.pmsurvey.org>. Acesso em: 21 nov. 2015.
Notas:
- É permitida a reprodução desse artigo, desde que citado o autor e a fonte (Impariamo® Cursos e Consultoria).
- Artigo originalmente publicado no site Meta Análise e republicado na Revista Alumni da ESIC (Espanha) n. 60 – edição de Outubro/2021 p. 36-37 (ISSN 18875327). Caso o link da Revista Alumni não funcione, para acessar o arquivo PDF, clique aqui!