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Idade cronológica e capacidade intelectual

Autor: Armando Terribili Filho da IMPARIAMO®.

 

Recentemente, um amigo solicitou-me indicação de um profissional especializado em Change Management para conduzir um complexo projeto no sul do país, ou seja, necessitava de uma consultoria da área de gerenciamento de mudanças para atuar em importante cliente. Não hesitei em mencionar um profissional experiente, competente e renomado na área requisitada. Ousaria dizer, uma referência nacional, com vasta experiência de mercado (foi executivo em multinacionais de origem norte-americana e europeia) e é docente de MBAs das melhores universidades de São Paulo. Ao amigo solicitante, mencionei um breve CV do profissional, suas competências, alguns projetos exitosos que coordenou e sua idade (na faixa etária de 65 anos).

No dia seguinte soube do veredito: rejeitado. Rejeitado pela idade! Sinceramente, isso é motivo de indignação, afinal, esse tipo de trabalho é intelectual, onde os principais atributos são: conhecimento, experiência, liderança, capacidade de comunicação e gestão de projetos.

Quando cogitei escrever este artigo, pensei se não seria um processo de autodefesa, de legislar em causa própria, pois me aproximo da sexta década vivida. Optei por escrever o artigo; afinal, competência e capacidade não se pode medir por cabelos brancos ou pela ausência de cabelos. Há jovens de notória capacidade e idosos também. Assim, prefiro deixar este julgamento a você leitor, após concluir esta leitura e fazer suas reflexões.

Nos EUA e Europa as pessoas mais experientes são valorizadas e desejadas pelas organizações, pois têm em seu background: conhecimento, habilidades, networking e vivências que podem solucionar problemas e evitar riscos. Evidentemente, desde que o profissional goze de boa saúde física e mental.

Na área de administração, alguns nomes precisam ser lembrados, que atuaram por longo tempo com vasta produção, sejam como professores, autores de livros ou consultores: Michael Porter (professor norte-americano da Harvard Business School, próximo aos 70 anos de idade, autor de diversos livros e da teoria das forças da competitividade), o austríaco Peter Drücker (falecido em 2005 com 96 anos, com dezenas de livros publicados, sendo que os seis últimos quando estava com mais de 90 anos de idade), William Edwards Deming, que viveu mais de 93 anos com atuação como consultor e autor de livros até 82 anos de idade).

Rodolfo Herberto Schneider e Tatiana Quarti Irigaray no artigo “O envelhecimento na atualidade: aspectos cronológicos, biológicos, psicológicos e sociais” (Revista Estudos de Psicologia, out-dez/2008) apresentam a definição de quatro idades: idade cronológica (tempo de vida decorrido em dias, meses e anos a partir do nascimento), idade biológica (considera as modificações corporais e mentais), idade social (hábitos e status em relação às pessoas de sua idade) e idade psicológica (relação entre idade cronológica e capacidades psicológicas: percepção, aprendizagem e memória, e também, as habilidades adaptativas dos indivíduos ao meio).

Quanto à idade psicológica, os autores afirmam que algumas capacidades cognitivas como a rapidez de aprendizagem e a memória diminuem naturalmente com a idade cronológica, no entanto, essas perdas podem ser compensadas por ganhos em sabedoria, conhecimento e experiência. Os autores desse artigo, após apresentar resultados de pesquisas científicas, afirmam: “o idoso não perde a capacidade de raciocínio e a idade não leva ao declínio das funções intelectuais, uma vez que a presença de patologias, e não a idade em si, está envolvida na maior parte dos problemas que interferem nas habilidades cognitivas dos idosos”.

Infelizmente, no Brasil há a política do descarte, de jogar fora e destruir aquilo que se julga antigo ou fora de moda. Isso não se aplica somente às pessoas e profissionais. Os móveis antigos (com histórias e tradições familiares) são substituídos por novos e frágeis, os clássicos casarões das cidades cedem espaço para edifícios, a “receita da vovó” perde espaço para o delivery, as roupas e sapatos servem somente para uma estação do ano, e assim, vamos nos tornando cada vez mais consumistas, esquecendo nossa história, nossos valores e desvalorizando o conhecimento, a experiência.

Caetano Veloso em Sampa (1978) sintetizou isso em um único verso: “Da força da grana que ergue e destrói coisas belas”. As exceções são os médicos, dentistas, advogados e acadêmicos que são valorizados pela sua experiência; evidentemente, mantendo-se atualizados com novos conceitos, técnicas e tecnologias, para que não fiquem ultrapassados.

Essa rejeição ao que não é jovem, faz com que neste país “reinvente-se a roda” o tempo todo, por não saber ouvir/aproveitar aquilo que já se mostrou útil e eficaz. Pela ausência de continuidade, de dar seguimento àquilo que foi iniciado – prova disso são os mandatos de prefeitos e governadores. Particularmente, tenho amigos jovens que respeitam e ouvem a experiência. São pessoas brilhantes que rejeitam estereótipos e fazem avaliações criteriosas e imparciais, valorizando os profissionais pelo seu desempenho e pelas suas atitudes, e não pela sua idade cronológica.

É evidente que algumas habilidades são notáveis nos jovens das Gerações Y e Z, que não se encontram nos Baby Boomers e nos integrantes da Geração X. A familiaridade e intimidade dos jovens da Geração Z (nativos digitais, nascidos a partir de 1990) com seus smartphones, a agilidade na comunicação por meio de redes sociais é admirável, e deve ser aproveitada em projetos das empresas.

Três especialistas norte-americanos em liderança: Dave Ulrich, Norm Smallwood e Kate Sweetman apresentam no livro “O código da liderança” (Bestseller, 2009) cinco dimensões de um líder: visão, capacidade de execução, gestão de talentos, gestão de competências empresariais e autoconhecimento. Em “gestão de competências empresariais”, os autores destacam que um líder se preocupa em fomentar o capital humano, desenvolvendo a próxima geração de líderes na organização. Afinal, ninguém fica para semente.

Sabemos que o envelhecimento da população mundial é um fato, e consequentemente, da força de trabalho também. Desta forma, discriminações etárias e estereótipos precisam ser  expurgados, pois se as pessoas vivem mais, acabam por estender sua carreira profissional também.

Passando ao largo da intenção em cindir jovens e idosos, o que se pretende é alertar que qualquer preconceito de faixa etária (jovens em relação a idosos ou vice-versa) é pobre, míope e tendencioso. A sabedoria reside na imparcialidade e na inteligência em saber distinguir o que é bom, qualificado, competente e capaz. Esse conjunto de atributos independe de idade cronológica, de gênero ou de qualquer outra característica que não interfira no desempenho profissional, e isso, um bom Gerente deve saber identificar.

Em tempo (exemplo adicional):

O sociólogo italiano Domenico de Masi aos 81 anos lançou seu novo livro “Uma simples revolução” pela Editora Sextante (O Estado de São Paulo de 26/maio/2019 – página E1).

Referências

SCHNEIDER, Rodolfo Herberto;  IRIGARAY, Tatiana Quarti .O envelhecimento na atualidade: aspectos cronológicos, biológicos, psicológicos e sociais. Revista Estudos de Psicologia, Campinas. out-dez/2008. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-166X2008000400013>. Acesso em: 17 maio 2015.

ULRICH, Dave; SMALLWOOD, Norm; SWEETMAN, Kate. O código da liderança: cinco regras para fazer diferença. Rio de Janeiro: Bestseller, 2009.


Nota: é permitida a reprodução desse artigo, desde que citado o autor e a fonte (Impariamo® Cursos e Consultoria).

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