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Gestão de Riscos em 11 dicas

Autor: Armando Terribili Filho da IMPARIAMO®.

 

Introdução

Muito se fala sobre Gerenciamento de Riscos em Projetos diante de situações caóticas como o caso do coronavírus – COVID-19 (pandemia declarada em 11/março/2020 pela Organização Mundial de Saúde), greve dos caminhoneiros no Brasil em maio/2018, o atentado de 11 de setembro em 2001 nas Torres Gêmeas de New York dentre outras.

A impressão que fica é que superada a crise, tudo volta ao normal e os riscos são colocados em segundo plano novamente, como se não existissem mais. Evidentemente que não se pretende pensar em Gerenciamento de Riscos dessa grandeza, o que seria impraticável para a grande maioria das organizações e dos projetos. Entretanto, há riscos que poderiam ser identificados e devidamente tratados nos projetos, evitando assim, atrasos, gastos adicionais não-previstos, problemas de qualidade nas entregas do projeto, etc. É neste cenário que o Gerenciamento de Riscos em Projetos será discutido neste artigo.

 

Resgate Histórico 

Dados sobre o Gerenciamento de Riscos em Projetos no Brasil tendo por base os benchmarkings conduzidos pelo PMI (Project Management Institute) no período de 2003 a 2010 são apresentados na Figura 1. Nota-se que a gestão dos riscos em projetos era predominantemente “mais informal que formal”, oscilando na faixa entre 50% e 60% nos oito anos estudados (TERRIBILI FILHO, 2014).

Figura 1 – Métodos de Gerenciamento de Riscos em Projetos (Brasil 2003-2010)

O número de organizações respondentes ao benchmarking foi crescente no período, chegando ao número de 460 organizações em 2010. Nesse período a pesquisa era exclusiva ao nosso país.

Desde 2011, os benchmarkings em Gerenciamento de Projetos passaram a ser realizados pelo PMSURVEY.ORG, com a inclusão de organizações de outros países das Américas, Europa e Ásia. Em 2011 participaram 754 organizações. Em 2012 foram 730. Nos anos seguintes, a participação foi de 676 organizações em 2013 e 400 em 2014. O último benchmarking de Gerenciamento de Projetos que foi divulgado foi o de 2014 com 400 organizações participantes, das quais, 82% do Brasil.

Analisando-se os percentuais, nesse benchmarking, nenhuma evolução observou-se no Gerenciamento de Riscos em Projetos de forma sistematizada, pois o percentual de “com metodologia estruturada foi reduzido de 36% para 32%) e inexistente subiu de 11% para 19%, conforme Figura 2.

Figura 2 – Métodos de Gerenciamento de Riscos em Projetos (Brasil 2003-2014)

11 Dicas

Dica 1 – Identificar os Riscos 

Conforme consta na 6ª. edição do Guia PMBOK, risco é “um evento ou condição incerta que, se ocorrer, provocará um efeito positivo ou negativo em um ou mais objetivos do projeto” (PMI, 2017, p. 723). Assim, pode-se dizer que um risco é uma ameaça, algo que ainda não ocorreu, mas que pode ocorrer.

Na fase de planejamento de um projeto deve-se procurar identificar a maior quantidade possível de riscos, sem avaliação prévia. Para essa etapa de identificação de riscos há diversas ferramentas como: brainstorming, brainwriting, análise SWOT, análise de causa-raiz, análise de premissas e restrições do projeto, lista de alertas (PESTLE: política, econômica, social, tecnológica, jurídica e ambiental; TECOP: técnica, ambiental, comercial, operacional e política; e VUCA: volatilidade, incerteza, complexidade e ambiguidade), consulta à base de lições aprendidas, opinião de especialistas, reuniões com a equipe, etc.

Em geral, os riscos estão associados a eventos, por isso, o Guia PMBOK alerta que os riscos não associados a evento (de variabilidade ou ambiguidade) precisam ser registrados. Exemplos: produtividade, complexidade sistêmica.

A identificação dos riscos pode ocorrer a qualquer momento no projeto, porém, lembre-se da importância de identificá-los e avaliá-los na etapa de planejamento, pois depois que você definir seu orçamento, os riscos identificados a posteriori poderão ficar sem cobertura financeira para eventuais tratativas de prevenção ou correção.

 

Dica 2 – Avaliar e priorizar os riscos 

Os riscos devem ser avaliados conforme sua severidade (relação direta entre probabilidade e impacto caso o risco se torne realidade). A priorização deve ser consistente com a severidade dos riscos, ou seja, os riscos com maior severidade devem ser os prioritários. Uma pergunta clássica sobre riscos em projetos “qual risco é mais severo para seu projeto: um terremoto ou a perda de um profissional-chave”. Em geral, a resposta imediata é o terremoto, mas é a resposta equivocada. Lembre-se que a severidade é dada por “probabilidade” e “impacto”. No caso, embora o impacto de um terremoto seja altíssimo (suponha uma escala de 0 e 10, onde “0” represente”muitíssimo baixo” e “10” seja “muitíssimo alto”, no caso, seria 10), a probabilidade no Brasil tende a zero (não é zero, mas muito próxima disso). Veja que a perda de um profissional-chave para o projeto tem uma probabilidade maior (por exemplo, 5%) e o impacto na mesma escala (entre 0 e 10, pode ser algo em torno de 3). O produto (impacto e probabilidade) determina a “severidade” do risco para o projeto; por isso, é preferível gerenciar o risco de perder o profissional-chave que se preocupar com um eventual terremoto.

Ressalta-se que o impacto pode ser tratado com várias dimensões e pesos, como: impacto nos custos, na qualidade, no escopo, no prazo do projeto.

 

Dica 3 – Efetuar a avaliação qualitativa de Mosler (se julgar oportuno)

O método de Karl Mosler, embora pouco utilizado no Gerenciamento de Projetos, efetua o cálculo da Classe do Risco com base em 6 elementos:

  • Função (F): nível de gravidade das consequências ou danos
  • Substituição (S): grau de dificuldade para substituição
  • Profundidade (P): grau de perturbação à imagem da empresa
  • Extensão (E): alcance e extensão dos danos
  • Agressão (A): probabilidade de o evento acontecer
  • Vulnerabilidade (V): impacto que pode ser causado

Mosler atribui valores de 1 (menor, baixo, pequeno) a 5 (maior, alto, grande) para cada um desses elementos, calculando então a magnitude e a probabilidade, dando origem à grandeza:


Desta forma, a priorização dos riscos pela classe é consistente com avaliação efetuada em seis dimensões e os critérios de ponderação.

 

Dica 4 – Calcular ou definir a Reserva de Contingência 

A Reserva de Contingência de um projeto pode ser um valor fixo (pouco usual), um percentual do valor do projeto (quando a organização executa projetos similares e conhece os riscos associados ao tipo de projeto que planeja/executa) ou pode ser calculada com base na análise quantitativa dos riscos. Há várias ferramentas de apoio, como árvore de decisão (uma técnica de diagramação e de cálculo para avaliar as implicações de uma corrente de opções múltiplas na presença de uma incerteza), simulações, análise de sensibilidade e diagramas de influência.  A Reserva de Contingência se calcula com base no Valor Monetário Esperado, ou seja, somatório dos produtos entre Probabilidade do Risco e seu Impacto Financeiro (caso o risco se torne realidade).

É importante ressaltar que como a Reserva de Contingência é calculada com base nos riscos identificados, conceitualmente, só poderá ser utilizada para atender exclusivamente os riscos “identificados” no projeto.

 

Dica 5 – Definir a Reserva Gerencial 

É uma reserva especial para suportar os riscos não identificados no projeto. Em geral, esses riscos (os não-identificados) quando ocorrem têm impacto muito forte no projeto, pois não foram previstos, nem analisados e muito menos tratados.

Não há regra cálculo dessa reserva que também pode ser utilizada para trabalhos adicionais não previsto (algo fora do escopo). Essa reserva faz parte do orçamento, mas não da linha de base de custos do projeto (baseline), conforme esquema contido no Guia PMBOK.

Dica 6 – Planejar Respostas aos Riscos 

Para cada risco selecionado, deve ser pensada uma ou mais respostas, podendo contemplar abordagens distintas:

  • Avoidance (prevenir, evitar) – eliminar o risco; em geral, é uma resposta dispendiosa em termos de custos.
  • Transference (transferir) – transfere para terceiros (exemplo: seguros).
  • Mitigation (mitigar) – ações para reduzir a probabilidade e/ou impacto.
  • Acceptance (aceitar)
  • Passive (sem plano) – aceita o risco e trata quando ocorrer (no máximo, “orar” antes da ocorrência e “chorar” depois da ocorrência).
  • Contingency (com plano) – prepara plano para implementar (se ocorrer o risco, dispara o plano).
  • Escalate (escalar) – fora do escopo do projeto ou da autoridade do gerente do projeto.

 

Dica 7 – Calcular os Custos das Respostas aos Riscos

 As respostas aos riscos (evitar, prevenir, mitigar, transferir e desenvolver o plano de contingência) são custos incondicionais, ou seja, os custos dessas ações ocorrerão, independentemente do risco se tornar realidade ou não. Assim, esses custos não têm nada a ver com “Reserva de Contingência”, pois são “custos do projeto”. Esse é um equívoco comum dentre profissionais menos experientes.

Quando as ações de mitigação reduzem a probabilidade de um risco, a nova probabilidade (pode ser chamada de “probabilidade revisada”) afeta diretamente o cálculo da Reserva de Contingência, reduzindo seu valor. Isso é lógico, pois se foram tomadas medidas preventivas (ações com custo no projeto para reduzir a probabilidade), então, a Reserva de Contingência será menor pois a probabilidade diminuiu (consulte a Dica 4 de como se calcula a Reserva de Contingência).

 

Dica 8 – Definir o Processo de Uso das Reservas (de Contingência e Gerencial)

 Cada organização deve definir os critérios de utilização das reservas, sobretudo, definir quais são os profissionais que têm autoridade para utilizá-las. Em geral, quem define esse processo é o PMO (Project Management Office) ou Escritório de Gerenciamento de Projetos.

Lembre-se de que a gestão de custos é efetuada sobre o baseline do projeto (estimativa de custos das aquisições, das atividades e da Reserva de Contingência), ou seja, apuração do IDC (Índice de Desempenho de Custos) ou CPI (Cost Performance Index). Um dos problemas é “quando” prever o uso da Reserva de Contingência, como “fluxar” nas estimativas do projeto. Algumas possibilidades: rateio mensal, rateio por milestone do projeto ou algum outro critério da organização. Essa medida é importantíssima, pois afeta diretamente o desempenho de custos do projeto e, por vezes, a avaliação do gerente do projeto.

 

Dica 9 – Apresentar “Gatilho” nos Riscos 

Sempre que possível e para riscos associados a eventos (excetua-se variabilidade e ambiguidade descritos na Dica 2), deve-se deixar claro qual é o “fato” que transforma o risco em realidade, ou seja, possibilitando a utilização da Reserva de Contingência. Por exemplo: imagine um projeto que é um show de um cantor canadense em Curitiba. Ao invés de se descrever um risco “baixo nível de vendas de ingressos”, seria melhor colocar “vendas de ingressos inferior a 70% a duas semanas antes do show”. A diferença é enorme, pois no primeiro caso, surgem as perguntas “o que é baixo nível de vendas?”, “quando se apura isso?”, “que ações devem ser tomadas?”, “quando?”. No segundo caso, a medição será feita duas semanas antes da data do show. Se o índice de vendas for 70% ou mais, o risco não se tornou realidade, ou seja, nada a fazer; caso contrário, devem ser disparadas as respostas previstas no Plano de Respostas, como: aumentar divulgação em Rádio/TV, buscar parcerias com empresas, dar descontos para aquisições em grupo, etc.

 

Dica 10 – Tratar os Riscos Positivos (Oportunidades)

São chamados de oportunidades. No Guia PMBOK há uma correlação direta para cada abordagem de Riscos (negativos) para Oportunidades. A forma de cálculo dos valores financeiros é a mesma dos riscos, porém, com sinal contrário.

 

Dica 11 – Gerenciar o Plano de Riscos 

Efetue a gestão dos riscos durante o ciclo de vida do projeto. Lembre-se que riscos deixam de existir (por exemplo, havia o risco do fornecedor atrasar em mais de 5 dias, porém, o fornecedor efetuou a entrega no prazo estabelecido em contrato). Por outro lado, novos riscos surgem e precisam ser tratados. No caso, as respostas com custos e aumento na Reserva de Contingência devem ser tratadas com a alta administração para aprovação de novos valores.

Um problema muito comum é a ausência de Gestão dos Riscos na execução do projeto, ou seja, após identificar os riscos, realizar as ações preventivas e calcular as reservas, nada mais é feito. Indicadores com apuração periódica (por exemplo, quinzenal, dependendo da duração do projeto) podem evidenciar se os riscos continuam sendo monitorados ou não.

 

Uma palavra final… 

No Gerenciamento de Riscos, para a grande maioria dos projetos, não há necessidade de se pensar em riscos como pandemias ou atentados como o 11 de setembro, entretanto, não se pode negligenciar o tema “riscos”.

No dia a dia, alguns riscos se tornam realidade, pois fornecedores atrasam suas entregas, softwares apresentam bugs inesperados, profissionais pedem demissão ou ficam doentes, enchentes comprometem a movimentação da equipe, aeroportos são fechados por conta de condições climáticas desfavoráveis, a energia elétrica cai quando menos se espera, acidentes ocorrem, enfim, são situações rotineiras e que podem impactar os projetos.

Se esses riscos forem identificados, analisados e tratados (com respostas adequadas) é bem provável que o impacto no projeto seja amenizado ou mesmo eliminado. Entretanto, se nem se pensou em um dado risco e ele se transforma em realidade, o que resta fazer é sair correndo para tentar solucionar os estragos acusados. Há muitos casos que isso é possível. Há outros que não. Aí, acuse o azar… Diga que ele (o azar) é o grande e único culpado, pois isso é muito mais fácil que assumir que não houve uma gestão profissional de riscos no projeto, por falha do gerente de projetos ou da alta administração que não quer saber de ouvir falar em riscos, pois por miopia acredita que isso representa exclusivamente custos adicionais, ou melhor, impacto na sua rentabilidade, ignorando que o sucesso do projeto ou até da empresa pode ficar seriamente comprometido.

 

Observação do autor:

Quando este artigo foi escrito, o Guia PMBOK® (Project Management Body of Knowledge) editado pelo PMI (Project Management Institute) estava em sua 6ª. edição (2017), que incluía a Reserva de Contingência no baseline de custos. Na 7a edição (2021), eliminou essa reserva do baseline! (isso afeta a dica 8). Um detalhe: alterou o nome da Reserva Gerencial para Reserva de Gerenciamento.

 

Referências

MANDARINI, Marcos. Segurança Corporativa Estratégica: Fundamentos”. Barueri: Manole, 2005.

PMSURVEY.ORG 2014 Edition. Estudo de Benchmarking em Gerenciamento de Projetos. Disponível em: <http://www.pmsurvey.org>. Acesso em: 30 set. 2016.

PROJECT MANAGEMENT INSTITUTE – PMI. Um Guia do Conhecimento em Gerenciamento de Projetos (Guia PMBOK®).6. ed. Pensilvânia: Project Management Institute, 2017.

TERRIBILI FILHO, Armando. Gerenciamento de riscos em projetos nas organizações no Brasil. Revista FAE, Curitiba, v. 17, n. 2, p. 154 – 177, jul./dez. 2014.

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