Profissional reflexivo: mais uma demanda para o gerente?

Autor: Armando Terribili Filho da IMPARIAMO®.
O filósofo e professor norte-americano John Dewey (1859-1952) tinha como posição que o aprendizado só ocorre quando há uma situação de “problema real” para ser resolvida. Seu seguidor, orientando em tese de doutoramento Donald A. Schön (1930-1997) afirmava que com base nos conhecimentos teóricos e na experiência prática é possível solucionar um problema passando pelas fases de caracterização da situação problemática, desenvolvimento da sugestão, observação, experimentação, reelaboração intelectual e verificação dos resultados.
A fase mais relevante neste processo é a reelaboração intelectual, por se caracterizar pela formulação de novas ideias, cuja riqueza é diretamente proporcional aos conhecimentos, vivência e experiência da pessoa. De acordo com os pensamentos de Schön, a formação dos profissionais passa por uma prática orientada com um forte componente na reflexão a partir de soluções de problemas reais, possibilitando que o profissional em formação enfrente situações novas e aprenda a tomar decisões.
O conhecimento é demonstrado pelos profissionais quando executam uma ação, mas há três tipos distintos de reflexão:
- reflexão na ação – é o pensar no decurso da ação sem interrompê-la, provocando reformulação do que está sendo feito, pois o profissional vivencia situações que extrapolam suas experiências prévias, tendo, entretanto, o conhecimento como base para a ação;
- reflexão sobre a ação – reconstrução mental da ação, analisando-a retrospectivamente e incorporando-a ao seu repertório de experiências adquiridas; e,
- reflexão sobre a reflexão na ação – é o processo que leva o profissional a progredir no seu desenvolvimento e construir sua forma pessoal de conhecer.
Se, por um lado, a reflexão na ação pode ser considerada um processo mental quase automático, a reflexão sobre a ação é intencional, exigindo da pessoa pré-disposição e vontade em realizá-la. O conjunto de reflexões sobre a ação é que determina a construção do saber, que pode ser considerada uma consequência das reflexões intencionais efetuadas.
Neste contexto surgiu o conceito de “profissional reflexivo” com forte viés para o “professor reflexivo” – alvo de críticas e elogios por educadores do país. Em artigo elaborado por mim em coautoria com Prof. Dr. Paschoal Quaglio da UNESP/Marília, apresentamos e detalhamos seis recomendações para que o docente possa atuar como “professor reflexivo”, que são:
- Faça uma reflexão sobre as estruturas e valores da instituição na qual atua.
- Registre as situações que ocorrem na ação educativa para posterior reflexão.
- Implante uma sistemática para realização de reuniões de análise de prática pedagógica.
- Atue como um professor reflexivo: seja um facilitador do aprendizado.
- Seja um professor pesquisador: demonstre isto aos alunos por seus exemplos.
- Atue como um professor crítico: tenha esta postura dentro e fora da sala de aula.
Atuando como Gerente de Projeto e estimulado por um estudante de mestrado de Recife que me escreveu recentemente, questionei-me sobre a aderência do conceito de profissional reflexivo para a área de Gerenciamento de Projetos e validade de exportar as recomendações do mundo pedagógico para o corporativo.
Um Gerente de Projeto vivencia em seu dia a dia os três níveis de reflexão apresentados por Schön: reflexão na ação (praticamente automática), reflexão sobre a ação (quando pensa no que deu certo, no que deu errado, nas reações e motivação da equipe, nos comentários do patrocinador do projeto, etc.) e a reflexão sobre a reflexão na ação, ou seja, quando estabelece o seu Lessons Learned (lições aprendidas) dos projetos – sejam documentadas ou não.
Quanto às seis recomendações (anteriormente enumeradas), se substituirmos o contexto de professor, aluno, ação educativa, prática pedagógica, sala de aula e aprendizado, por respectivamente, Gerente de Projeto, integrantes da equipe do projeto, dia a dia do projeto, prática do projeto, ambiente organizacional e execução das atividades, poderemos verificar que há a aderência é total:
- Faça uma reflexão sobre as estruturas e valores da instituição na qual atua.
- Registre as situações que ocorrem no dia a dia do projeto para posterior reflexão.
- Implante uma sistemática para realização de reuniões de análise crítica de prática do projeto.
- Atue como um Gerente de Projeto reflexivo: seja um facilitador da execução das atividades.
- Seja um Gerente de Projeto pesquisador: demonstre isto aos integrantes da equipe do projeto por seus exemplos.
- Atue como um Gerente de Projeto crítico: tenha esta postura dentro e fora do ambiente organizacional.
Assim, o Gerente de Projeto além de conhecer as boas práticas contidas no Guia PMBOK® (Project Management Body of Knowledge) do PMI (Project Management Institute), englobando a gestão do escopo, do cronograma, custos, prazos, pessoas, qualidade, aquisições e riscos, deve assumir sua posição de profissional reflexivo, pesquisador e crítico.
Notas:
- É permitida a reprodução desse artigo, desde que citado o autor e a fonte (Impariamo® Cursos e Consultoria).
- Artigo originalmente publicado no site Meta Análise e republicado no livro “Gerenciamento de Projetos em 7 Passos” (Editora M.Books, São Paulo, 2011 – reimpressão Editora Alta Books, Rio de Janeiro, 2024), p. 209-211.