A cultura organizacional e o gerenciamento de projetos
Autor: Armando Terribili Filho da IMPARIAMO®.
No mundo empresarial e acadêmico, ouve-se em reuniões e conversas informais nos corredores, que a grande vilã pela estagnação da organização é a “cultura”. Esse termo parece imobilizar a todos, como se fosse um veredito final e inibidor de toda e qualquer tentativa de inovação, de mudança de processos, de progresso, de evolução. Todos já ouviram as afirmativas: “É assim mesmo! É a cultura da organização, não mexa nisso!”.
Alunos de graduação e pós-graduação têm reportado suas dificuldades e tentativas frustradas para implantar um gerenciamento profissional de projetos, com base no que têm aprendido, pesquisado e debatido sobre o tema em sala de aula. Mas, enfim, o que é esse ser paralisante chamado “cultura organizacional”?
No livro “Cultura Organizacional: formação, tipologia e impacto”, a autora e especialista no tema Maria Ester de Freitas (Makron Books, 1991), que publicou outras obras sobre o mesmo tema, apresenta de forma didática: conceitos, os elementos da cultura organizacional, sua formação, enfim, traz para o debate renomados experts no importante assunto. Por exemplo, a autora apresenta a definição de Edgard Schein para cultura organizacional: “o modelo de pressupostos básicos, que determinado grupo tem inventado, descoberto ou desenvolvido no processo de aprendizagem para lidar com os problemas de adaptação externa e integração interna.
Uma vez que os pressupostos tenham funcionado bem o suficiente para serem considerados válidos, são ensinados aos demais membros como a maneira correta para se perceber, pensar e sentir-se em relação àqueles problemas”. Outro especialista, Paul Shrivastava, de forma objetiva, conceitua cultura organizacional como sendo um conjunto de produtos pelos quais o sistema organizacional é estabilizado e perpetuado, incluindo: sistemas de valores, sistemas de linguagem, normas de comportamento, símbolos, mitos, sagas, metáforas, cerimônias e rituais.
Outros autores assumem a cultura organizacional como sendo “valores compartilhados”, que são crenças e conceitos que formam o coração da organização, sua filosofia, estabelecendo padrões e definindo o direcionamento para o comportamento diário dos trabalhadores. É fácil observar no dia a dia, aspectos culturais de uma organização quanto à flexibilidade no horário de entrada, padrões de qualidade dos serviços, uso de vestimentas formais ou informais pelos funcionários, níveis de controle e de autonomia estabelecidos, políticas de reconhecimento e valorização dos profissionais, dentre outros.
Dentre os autores que apresentam tipologias sobre cultura organizacional, Maria Ester de Freitas apresenta Charles Handy e Roger Harrison, que definem quatro ideologias organizacionais: cultura do poder, cultura de papéis, cultura da tarefa e cultura da pessoa. A “cultura do poder” é mais característica em pequenas organizações com poder concentrado em um ponto central, com poucas regras e procedimentos. Não são organizações processuais, valorizando o indivíduo pelos resultados, apresentando alto índice de rotatividade nas camadas médias.
A “cultura de papéis” trabalha pela lógica e racionalidade, com descrição de tarefas, definição de autoridade, de procedimentos para comunicação e regras para a solução de disputas. Enquanto na “cultura do poder” a organização reage rapidamente às ameaças, na “cultura de papéis” a organização é lenta para identificar a necessidade de mudanças.
O terceiro tipo é a “cultura da tarefa”, que é orientada para o trabalho e projetos, onde o estabelecimento de equipes multidisciplinares para solucionar problemas é valorizado e estimulado, possibilitando reação rápida e criativa. Embora o clima, em geral, seja agradável, as organizações com “cultura da tarefa” tendem a concentrar disputas pelos recursos, uma vez que são limitados, levando a um endurecimento do controle, por meio de regras e procedimentos. O quarto tipo é a “cultura da pessoa”, considerada rara pelos autores, pois são subordinadas a indivíduos e a seus valores. Citam como exemplo na “cultura da pessoa” algumas pequenas empresas de consultoria.
Maria Ester de Freitas, em seu estudo, analisa o impacto da cultura na performance organizacional sob a ótica de lucratividade e aumento de receita (crescimento), em onze dimensões que refletem as culturas das organizações: clareza de direção, alcance profissional, integração, contato com a administração superior, encorajamento da iniciativa pessoal, resolução de conflitos, clareza de desempenho, ênfase no desempenho, orientação para a ação, compensação e desenvolvimento de recursos humanos.
O que todos nós temos que saber é que “cultura” é algo dinâmico, uma vez que está alicerçada em valores. As pessoas com mais idade devem se lembrar de que há algumas décadas passadas, as mulheres que fumavam na rua eram mal vistas pela sociedade. Depois de alguns anos, as mulheres que fumavam demonstravam independência e autonomia; hoje, fumar é algo aceito, porém considerado inadequado à saúde, seja para homens ou mulheres.
O processo de mudança cultural nas organizações tem sua origem, sobretudo, nos líderes que transmitem os valores “da” e “para a” organização. Assim, de forma direta ou indireta, todos nós – por meio de nossas ações e atitudes – somos responsáveis pela manutenção, pelo questionamento ou mudança da cultura na organização onde atuamos.
Evidentemente que fatores externos podem afetar a cultura das organizações de forma brusca. Exemplo disso é a SOX (Lei Sarbanes-Oxley de 2002) que motivada por escândalos financeiros corporativos impôs a criação de mecanismos confiáveis de auditoria e segurança (governança; compliance) nas organizações norte-americanas e estrangeiras com ações na Bolsa de Nova York, a fim de reduzir riscos e fraudes nos negócios.
Retornando ao início do texto e ao questionamento de alunos sobre as dificuldades da cultura da organização para a implantação de um gerenciamento profissional de projetos, pode-se dizer se a cultura organizacional for “voltada à tarefa” ou “de papéis”, provavelmente, eventuais barreiras já foram removidas ou se encontram em fase de solução; nesses casos, cabe a você incentivar esse processo, agindo proativamente, apresentando ferramentas e técnicas que tem tido contato em seus estudos e pesquisas, a fim de propor novas soluções.
Caso a organização na qual você atua seja da “cultura do poder” ou da “cultura da pessoa”, o trabalho será mais árduo, uma vez que os benefícios que a organização pode obter com a implantação de uma metodologia de gerenciamento de projetos devem caminhar pela teia da organização até chegar ao “centro nevrálgico” do poder. Trata-se de uma tarefa difícil, pois exigirá de você determinação, empenho, conhecimento, persistência, paciência, capacidade de persuasão, e sobretudo, ação. Você pode não fazer nada, dando a vitória à inércia; ou então, posicionar-se como uma agente de mudança cultural, como um líder, lutando por aquilo que acredita e realizar-se profissional e pessoalmente. Boa sorte!
Notas:
- É permitida a reprodução desse artigo, desde que citado o autor e a fonte (Impariamo® Cursos e Consultoria).
- Artigo originalmente publicado no site Meta Análise.